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descentralizando                                         olhares

A hierarquia que coloca o centro como centro e a periferia como periferia cai por terra batida de um campinho de futebol quando se observa as fotografias dessa exposição. O centro da cultura dessas crianças, autoras das fotos, encontra-se em seus próprios bairros. Em comum, temos elementos da cultura brasileira, como o futebol, a praça, o bar, a igrejinha, cachorro e gato soltos. Outros elementos estão meio sumidos por aqui, mas continuam por lá, como é o caso do campinho e do brincar na rua. A Branca de Neve e alguns anões, o crânio de um boi, a menina soprando nuvem, os grafites. Algumas flores e árvores (e crianças nas árvores). Retratos de moradias precárias e de um homem cuja moradia é a rua.

Tudo é cultura. E todo olhar pode ser artístico, pois consegue transformar a dura realidade em imagens como as dessa exposição, cheias de simbologia e significado. E também de poesia visual, em texturas, luz, cores, linhas, composições e perspectivas.

Não se trata de uma romantização desses locais onde nossos artistas vivem – o olhar sério, belo e castanho de uma das fotos não deixa isso acontecer –, mas do reconhecimento da beleza dessas produções e da cultura desses territórios.

Portanto, se existe comoção diante das imagens aqui expostas e a vontade de incluir essas crianças em uma vida mais digna, por meio da educação de qualidade e de uma expansão cultural, é fundamental compreender que nem esta e nem aquela podem ser doadas, levadas, aplicadas, pois as duas constroem-se em conjunto e com respeito mútuo. Só pelo reconhecimento da cultura do outro é possível combater ideias preconceituosas e ações discriminatórias que colaboram para aumentar a segregação já provocada pela pobreza. Que essa mostra nos ajude a refletir para não sermos mais o “eles lá e nós aqui”. E sermos todos nós vivendo com dignidade.

Caroline Ferreira

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